Marketing da Betano vira canal informal: jogadores oferecem Pix por cadastro e ignoram regras do setor
- Fred Azevedo
- 23 de mai.
- 6 min de leitura
Atualizado: há 6 dias
Denúncia expõe risco legal e reputacional
Uma denúncia feita ao Portal Fred Azevedo revela um movimento cada vez mais comum em grupos de apostas no Facebook: jogadores comuns oferecendo dinheiro para atrair cadastros na plataforma da Betano, utilizando o programa oficial “Indique um amigo”.
A prática, embora aparentemente autorizada pela operadora, foge dos padrões éticos e legais exigidos para publicidade de apostas no Brasil.
Willian Júnior, que nos procurou espontaneamente, compartilhou prints, relatos e contexto detalhado sobre como a promoção vem sendo explorada de forma massiva, descontrolada e, em muitos casos, sem qualquer tipo de supervisão.
“A Betano tirou os afiliados responsáveis e agora deixa na mão dos clientes o marketing.”— Willian Júnior, à reportagem
A frase resume a denúncia: a operadora parece ter trocado estrutura profissional por um “boca a boca” digital sem critério, controle ou conformidade.
A denúncia
Willian conta que descobriu a prática ao navegar por grupos populares de apostas no Facebook com nomes como "LENDAS BET – BET365 – BETANO". Em publicações recentes, usuários oferecem de R$ 5 a R$ 30 via Pix para quem se cadastrar com seu link de indicação na Betano.

O objetivo é liberar a bonificação da campanha oficial — uma aposta grátis de R$ 30.
“Isso deveria ser papel dos afiliados profissionais, com contrato e responsabilidade. Jogador comum não tem formação para fazer o marketing da Betano de forma responsável.
Vai prometer ganho fácil, apelar pra qualquer público e ninguém vai fiscalizar isso”, explica.
Como funciona a promoção da Betano
O programa “Recomende um Amigo” da Betano oferece R$ 30 em aposta grátis para quem indicar e para quem for indicado. A ação, por si só, é comum no setor — mas precisa seguir regras claras.
Nas capturas de tela, é possível ver o modelo:
Um link pessoal de cadastro é gerado pelo site oficial;
O jogador compartilha esse link nas redes sociais;
Quando alguém se cadastra e verifica a conta, os dois recebem bônus.

O problema é o uso informal desse sistema como fonte de renda e moeda de troca. Muitos usuários oferecem até dinheiro para convencer pessoas a se cadastrarem, sem deixar claro que estão sendo comissionados.
Onde está o erro de marketing da Betano?
Segundo o Anexo “X” do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária (CONAR), toda publicidade de apostas deve:
Ser identificada como publicidade;
Incluir alerta 18+ e mensagem de jogo responsável;
Mencionar a licença da operadora;
Evitar prometer ganhos, retorno financeiro ou “dinheiro fácil”.
Nenhuma dessas exigências aparece nos posts. São promessas diretas de R$ 30 “de graça”, feitas por usuários comuns, sem qualquer disclaimer legal.
“A Betano está incentivando isso ao deixar o sistema solto. Quem sai prejudicado é a imagem da empresa, que se apresenta como séria, mas terceiriza o marketing pra qualquer um”, comenta Willian.
Além do CONAR, a prática descrita também entra em colisão direta com dispositivos da Lei nº 14.790/2023, que trata da publicidade de apostas em ambiente regulado, e com os princípios estabelecidos pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC).
O artigo 9º da Lei 14.790 determina que as operadoras devem “adotar medidas para evitar a indução de menores de idade e consumidores vulneráveis ao consumo excessivo do produto”, incluindo exigência de identificação clara da publicidade, faixa etária e mensagens preventivas.
Já o artigo 36 do CDC exige que “toda publicidade seja veiculada de forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal.”
Ao permitir que jogadores comuns promovam links com incentivo financeiro disfarçado, a Betano corre o risco de ser enquadrada por omissão na comunicação publicitária.
Print não é contrato: os riscos para a marca
A Betano é uma das operadoras mais visíveis do Brasil. Patrocina o Campeonato Brasileiro, clubes como Fluminense e Atlético-MG e tem presença massiva em mídia esportiva.
Mas ao permitir que jogadores comuns assumam a linha de frente da sua divulgação sem qualquer orientação, abre-se um flanco perigoso:
Publicidade feita por menores de idade ou para menores;
Mensagens que sugerem “renda garantida”;
Exploração de vulnerabilidade financeira;
Impossibilidade de fiscalizar o conteúdo publicado.
É o que Willian chama de “marketing amador sem compliance”. A empresa, ao descentralizar, perde o controle da mensagem — e, em última instância, assume o risco regulatório das falas de seus promotores informais.

Reação da Betano
William entrou em contato com a assessoria da Betano para questionar:
Se existe limite para a promoção por jogador;
Se há verificação de identidade de quem divulga os links;
Quais ações estão sendo tomadas para impedir a publicidade não autorizada;
Se a empresa ainda mantém vínculo com afiliados profissionais.
Até o momento da publicação, não houve resposta.
Vale destacar que o programa “Recomende um Amigo” é uma prática comum no setor, adotada por diversas casas legalizadas e licenciadas.
O que está em debate não é o modelo em si, mas a ausência de um filtro claro sobre quem pode promovê-lo, como e com quais limites.
Não se trata de criminalizar a bonificação por recomendação — mas de exigir coerência entre o discurso de jogo responsável e a prática comercial cotidiana.
Até que a Betano apresente uma política clara sobre esse canal, a responsabilidade institucional recai, sim, sobre ela.
O outro lado: alta demanda e atraso nos bônus
Willian também compartilhou um e-mail enviado por uma representante da Betano, reconhecendo atrasos na liberação dos bônus da campanha “Indique um Amigo”, devido à “alta demanda”.

Isso mostra que o volume de cadastros por essa via é expressivo — mas também desorganizado.
A própria empresa admite que está tendo dificuldade em atender os pedidos que ela mesma gerou.
A diferença entre afiliado e “jogador influenciador”
Um afiliado profissional é um parceiro com contrato formal, comissionamento baseado em resultado, exigências de conformidade e monitoramento de performance.
O “jogador influenciador” que divulga links por conta própria:
Não passa por treinamento;
Não conhece as regras do CONAR;
Não sabe distinguir termos legais de marketing abusivo.
Transformar o segundo em canal oficial de aquisição sem filtro é uma escolha arriscada — e possivelmente ilegal.
O risco é ainda maior quando se considera que a Portaria SPA/MF nº 827/2024, publicada pelo Ministério da Fazenda, obriga as operadoras licenciadas a manter controle sobre seus canais e ações de marketing — inclusive ações promovidas por terceiros ou influenciadores informais.
O artigo 6º da portaria deixa claro que operadoras devem “zelar pela integridade, clareza e legalidade das mensagens comerciais vinculadas direta ou indiretamente à sua marca”.
Isso inclui campanhas de indicação, bonificações e ações promocionais de recrutamento — mesmo que realizadas por usuários fora de vínculo formal.
Considerações finais
A Betano investe milhões para consolidar sua imagem como operadora de confiança no Brasil. Mas se continuar terceirizando sua reputação para o marketing improvisado de jogadores comuns, poderá colocar tudo isso em xeque.
“A Betano tirou os afiliados responsáveis e agora deixa na mão dos clientes o marketing.”— Willian Júnior
A frase é forte. E resume o ponto: não basta patrocinar o Brasileirão se a base da operação está desprotegida.
A publicidade de apostas exige mais do que slogans. Exige estrutura, critérios e controle.
Se a Betano não sabe quem está falando em seu nome, talvez já não saiba mais o que está em jogo.
Agradecemos a disponibilidade do sr. Willian Júnior pela entrevista, primordial para a construção desta matéria. Mantemo-nos abertos para expor o lado da Betano, com transparência e de acordo editorial com o que pede a ética jornalística. Nota editorial
Esta matéria segue os princípios de apuração e transparência do Portal Fred Azevedo. A denúncia que motivou a investigação foi espontaneamente enviada por um jogador identificado, com provas documentais (prints e mensagens públicas) que evidenciam a exploração irregular do programa de indicação da Betano por usuários comuns em redes sociais.
A reportagem buscou a assessoria da Betano para obter esclarecimentos sobre os critérios, limites e fiscalização da campanha “Recomende um Amigo”. Até o fechamento deste conteúdo, não houve resposta.
Reforçamos que o modelo de bonificação por recomendação é prática comum e legal no setor — desde que respeite as diretrizes previstas na Lei nº 14.790/2023, no Código de Defesa do Consumidor e no Anexo “X” do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária do CONAR. O foco da matéria não é a existência da bonificação, mas o risco reputacional e regulatório de sua execução sem controle.
O Portal permanece aberto para publicar a posição da Betano, caso ela se manifeste futuramente, em respeito ao direito de resposta e à integridade da informação.