Bets são chamadas de predatórias — mas e a capitalização, a loteria de terno e gravata?
- Fred Azevedo
- 11 de set.
- 4 min de leitura
Se você abrir os jornais, vai encontrar manchetes sobre como as bets “ameaçam” a juventude, “incentivam o vício” e “precisam ser controladas com rigor”. O setor de apostas esportivas e jogos online, regulado desde a Lei nº 14.790/2023, é descrito como predatório por natureza.
Agora, no mesmo período, uma outra modalidade igualmente baseada na sorte arrecadou R$ 13,9 bilhões em apenas cinco meses de 2025. Chama-se título de capitalização. É vendido por bancos como disciplina financeira, recebe elogios institucionais e sequer aparece nas manchetes de risco social.
Dois jogos de azar. Dois mercados bilionários. Dois tratamentos radicalmente diferentes.

O que dizem os números
De acordo com a Federação Nacional de Capitalização (FenaCap), o segmento movimentou R$ 13,9 bilhões de janeiro a maio de 2025. No mesmo período, distribuiu R$ 830 milhões em prêmios de sorteios — menos de 6% do arrecadado — e manteve reservas técnicas de R$ 43 bilhões.
Já as bets, segundo dados oficiais da Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda, geraram R$ 17,4 bilhões de GGR no primeiro semestre de 2025. O Brasil tem 17,7 milhões de apostadores ativos, que gastam em média R$ 164 por mês.
Ambos os setores são bilionários. Ambos vivem do mesmo combustível: a promessa da sorte. A diferença é como são narrados.
Capitalização: loteria disfarçada de investimento
O título de capitalização é vendido como um produto financeiro sério. Bancos oferecem no balcão, vinculam a contratos de aluguel, usam como garantia em operações. Na propaganda institucional, fala-se em “planejamento”, “disciplina” e “versatilidade”.
Mas a verdade é mais simples: trata-se de uma loteria de longo prazo, onde parte do valor pago vai para sorteios e taxas, e outra parte é “reservada” para devolução futura — corrigida por índices irrisórios. No fim do contrato, muitos clientes recebem menos do que investiram, a menos que sejam sorteados.
Apesar disso, a capitalização é blindada pelo selo da Susep, não sofre restrições de publicidade e é até promovida como ferramenta de cidadania financeira.
Bets: predatórias ou reguladas ao extremo?
Enquanto isso, as bets enfrentam um regime regulatório severo:
Obrigação de sede no Brasil e autorização prévia do Ministério da Fazenda.
Políticas de prevenção à lavagem de dinheiro e integridade esportiva.
Publicidade restrita, com proibição de apresentar o jogo como renda ou investimento.
Ferramentas obrigatórias de jogo responsável, incluindo autoexclusão, limites de tempo e de valor, monitoramento de risco e exclusão de beneficiários de programas sociais.
Ou seja: o setor, mesmo bilionário, é vigiado em cada detalhe. Ainda assim, as manchetes não hesitam em classificá-lo como “predatório”.
Quando a capitalização vira raspadinha digital
Se na teoria a capitalização é vendida como disciplina financeira, na prática o marketing conta outra história. Campanhas recentes mostram mascotes animados, push notifications com frases como “Ganhe até R$ 30 mil com apenas R$ 10!” e telas coloridas que remetem diretamente a raspadinhas.

O detalhe é que o termo “capitalização” só aparece depois do clique, escondido atrás de linguagem lúdica e promessas de ganho instantâneo. Legalmente, a informação está lá. Mas, do ponto de vista da transparência, a sedução vem antes da explicação.

Imagine se fosse uma bet usando os mesmos recursos: bônus relâmpago, mascote chamativo e promessa de prêmio fácil.
Quantos especialistas correriam para denunciar o apelo “predatório”?
Quantas manchetes surgiriam sobre vulnerabilidade e proteção ao consumidor?
Mas como a prática vem de bancos tradicionais, o discurso muda: “é só um incentivo para poupar”. O mesmo gatilho emocional que nas apostas seria censurado vira “estratégia de engajamento” quando parte do sistema financeiro. Dois pesos, dois discursos.
A hipocrisia regulatória
Eis a contradição.
A capitalização, um produto de retorno nulo, que depende da sorte e se disfarça de investimento, é vendida livremente, sem botão de autoexclusão, sem restrições de marketing, com linguagem positiva e institucional.
As bets, que assumem desde o início serem jogos de azar, são submetidas a regras estritas, demonizadas no debate público e apontadas como vilãs do vício.
Ambos são jogos de sorte. Mas só um deles veste terno e gravata, com a bênção de bancos e seguradoras.
Bets predatórias e capitalização: dois pesos, duas medidas
Chamar as bets de predatórias enquanto a capitalização segue blindada é, no mínimo, uma incoerência institucional. O título de capitalização não apenas oferece retorno financeiro pior que qualquer aplicação simples como a poupança, como ainda engana o cliente ao se travestir de produto de investimento.
É fácil demonizar o apostador esportivo jovem e conectado. Mais difícil é questionar o sistema financeiro tradicional, que empurra “poupança com prêmios” a idosos e correntistas desavisados.
Se o problema é o risco social, por que a capitalização não está no radar da política pública?
Se o problema é transparência, por que não se exige das seguradoras os mesmos padrões de jogo responsável aplicados às bets?
Conclusão
No fim das contas, a diferença não está na natureza do produto, mas em quem controla a narrativa. As bets são o alvo preferido porque desafiam estruturas tradicionais e carregam o estigma da juventude digital. Já a capitalização é a loteria oficializada do sistema financeiro — com aval da Susep, discurso de disciplina e cifras bilionárias a salvo de críticas.
Chamam as bets de predatórias. Mas a verdadeira predação pode estar naquilo que se vende como disciplina financeira e termina como uma aposta cara, com terno, gravata e carimbo institucional.
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