Felca na CPI das Bets: quando a pauta vira palanque
- Fred Azevedo
- 26 de mai.
- 5 min de leitura
Atualizado: 9 de jun.
Na CPI das Apostas, o espetáculo não para.
Depois de influenciadores, padres, youtubers e memes ao vivo, a comissão agora convoca oficialmente Felca — criador de conteúdo conhecido por seus vídeos de humor, crítica estética e, mais recentemente, pelo ataque frontal à presença de Virginia Fonseca na audiência do Senado.
A convocação, anunciada pela senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), trata Felca como um “contraponto necessário” à narrativa dominante.
Mas o que isso revela, de fato, sobre o estado da CPI?
E mais: por que essa convocação pode comprometer — ou ao menos ofuscar — o real propósito da comissão parlamentar?
O que Felca traz à CPI?
Felca, nome artístico de Felipe Bressanim, acumula mais de sete milhões de seguidores e uma base jovem e fiel.
Ele viralizou após publicar um vídeo dizendo ter recusado um contrato de R$ 50 milhões para divulgar uma plataforma de apostas durante três meses.
A justificativa foi moral: segundo ele, o dinheiro vinha diretamente da perda dos seus seguidores.
“Quando você bota o cupom do influenciador, 50% do que você perde vai pra ele. Então o dinheiro que compra carrão, mansão, relojão… vem da sua derrota”, afirmou.
Do ponto de vista do discurso público, há valor no que Felca denuncia. Ele explicita de forma crua um modelo de monetização baseado no insucesso alheio.
Em um mercado onde a vitrine é o luxo e a conversão se dá por aspiração, Felca fala o que muitos influenciadores silenciam.
Mas… essa é a função de um depoente de CPI? E mais: isso justifica transformá-lo em personagem central da investigação?

Quando o engajamento supera o conteúdo
A CPI das Bets foi criada com um objetivo nobre: apurar os impactos sociais, econômicos e institucionais do mercado de apostas no Brasil.
Especialmente no contexto de regulamentação recente, era a chance de fazer o Senado encarar a dura realidade de um setor que movimenta bilhões — muitas vezes à margem da proteção ao consumidor.
O que se vê, no entanto, é uma comissão que tropeça entre o sensacionalismo e o populismo digital.
Primeiro, foi a convocação de influenciadores com contratos ativos. Depois, a tentativa de “lacrar” ao vivo com padres e blogueiras.
Agora, a entrada de um youtuber que, embora denuncie os bastidores da publicidade, não representa vítimas, não traz dados, nem estrutura crítica técnica sobre o setor.
A CPI está sendo pautada por quem viraliza — não por quem fiscaliza.
O risco de deslegitimar a comissão
Ao trazer Felca como destaque, o Senado transforma um espaço institucional em palco de narrativa. E isso não fortalece a crítica à publicidade de apostas — enfraquece.
Porque o foco se desloca do problema estrutural (falta de fiscalização, omissão das operadoras, vulnerabilidade dos jogadores) para o ruído performático. A denúncia vira personagem. A crítica vira bordão.
E nesse processo, os verdadeiros problemas deixam de ser debatidos com profundidade:
A ausência de uma política nacional de prevenção à ludopatia;
A exploração de menores por meio de influenciadores disfarçados de "jogadores";
O uso distorcido de ferramentas como cashback e roleta grátis sem transparência legal;
O descumprimento de regras básicas de Jogo Responsável mesmo por casas licenciadas;
Nada disso estará na mesa quando Felca for ouvido. Estarão os clipes, os cortes, as manchetes — e a ilusão de que se está combatendo um problema apenas por criticá-lo em voz alta.
O contraditório que falta
Importante dizer: o portal não questiona o direito de Felca se posicionar. Ele tem, como qualquer cidadão, liberdade para recusar contratos e denunciar práticas que considera antiéticas.
Também é válido que o Senado ouça vozes dissonantes. A crítica à simbiose entre apostas e influência digital é legítima, urgente, necessária.
Mas isso não justifica transformar a CPI em reality show.
Nem colocar no centro da discussão alguém cuja maior qualificação é "ter dito não". Porque dizer "não" é uma posição pessoal. Não é política pública. Não é regulação. Não é fiscalização.
Ao colocar Felca como símbolo moral da CPI, o Senado sinaliza que prefere o embate estético à transformação estrutural. Que prefere o conteúdo que engaja ao conteúdo que incomoda o sistema.
As perguntas que ninguém está fazendo
A CPI das Bets virou um jogo de narrativas. Mas há perguntas que ainda não foram feitas — e que Felca, com toda sua visibilidade, provavelmente não responderá:
Por que o Governo Federal ainda não instituiu um plano nacional de prevenção à ludopatia?
Por que o Ministério da Fazenda, por meio da SPA, ainda não aplicou sanções visíveis a operadoras licenciadas que descumprem regras de saque e atendimento?
Por que plataformas como YouTube, TikTok e Instagram seguem permitindo a veiculação de publicidade disfarçada de conteúdo orgânico, mesmo após denúncias formais?
Onde estão os dados de compulsividade, suicídio, endividamento e evasão escolar relacionados ao vício em jogos online?
Essas perguntas não rendem cortes para o Instagram. Mas são elas que dariam dignidade ao trabalho da comissão.
O argumento por trás da convocação de Felca na CPI
A senadora Soraya Thronicke afirma que convocar Felca é dar voz à denúncia popular, ao influenciador ético, ao jovem que se recusa a lucrar sobre a ruína alheia.
E é verdade que a CPI precisa sair da bolha institucional. Precisa ouvir quem está do outro lado da tela.
Mas é preciso saber quem representa o quê. Felca representa uma narrativa de rejeição. Mas não traz propostas. Não articula soluções. Não convive com vítimas. E não responde pelas omissões das casas, das plataformas ou do Estado.
Ou seja: ele é parte da discussão pública. Mas não pode ser o centro da formulação política.
Conclusão: precisamos de lei, não de likes
O Brasil está diante de um divisor de águas. Pela primeira vez, o setor de apostas será regulado com exigências de compliance, obrigações de transparência e princípios de proteção ao jogador. Ou pelo menos deveria ser assim.
Mas enquanto o Senado se rende ao conteúdo viral, o que deveria ser comissão de investigação se transforma em comitê de engajamento.
Felca pode ter princípios. Pode ter razão. Mas não pode ser a régua. Porque o que está em jogo não é a imagem de um influenciador. É a integridade de um setor que movimenta bilhões com pouco controle.
O Portal Fred Azevedo segue acompanhando, com responsabilidade editorial, as movimentações da CPI — e continuará a cobrar do Senado o que nenhuma thread no X ou vídeo no YouTube substitui: seriedade institucional, fiscalização efetiva e compromisso com o jogador comum.
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