O acordo entre a IBIA e o Ministério do Esporte
- Fred Azevedo
- há 17 horas
- 6 min de leitura
Nesta semana, a International Betting Integrity Association (IBIA) celebrou a assinatura de um acordo de cooperação com o Ministério do Esporte, liderado por André Fufuca.
A parceria, amplamente repercutida no setor, promete reforçar os mecanismos de combate à manipulação de resultados em apostas esportivas online, permitindo a troca de informações sensíveis sobre atividades suspeitas no mercado brasileiro.
Na superfície, tudo parece alinhado: mais proteção, mais transparência, mais integridade. Mas a pergunta inevitável é: quem se beneficia — e quem fiscaliza esse modelo?

Negociação entre o IBIA e o Ministério do Esporte: colaboração, dados e vigilância
Segundo nota divulgada pela própria IBIA, a cooperação envolve o compartilhamento de informações em tempo real sobre padrões incomuns de apostas, além de apoio direto em investigações envolvendo clubes, atletas e plataformas.
O CEO da entidade, Khalid Ali, afirmou:
“Esse acordo garantirá que as informações sobre apostas suspeitas sejam compartilhadas prontamente com o ministério. Isso inclui o acesso a dados detalhados em nível de conta, disponíveis apenas por meio da rede exclusiva da IBIA.”
A IBIA monitora mais de US$ 300 bilhões por ano em volume de apostas ao redor do mundo, cobrindo mais de 140 marcas, e afirma representar mais de 70% do mercado de apostas online já licenciadas no Brasil.
O ministro André Fufuca celebrou o acordo como um “marco na luta contra a manipulação de resultados”, afirmando que o pacto permitirá “instrumentos mais do que suficientes para coibir essa prática”.
Mas a depender de como esse sistema for operado — e fiscalizado — os riscos são tão grandes quanto as promessas.
A promessa de integridade no papel
Desde a promulgação da Lei nº 14.790/2023, uma das exigências para operadoras obterem licença no Brasil é a filiação a um órgão independente de monitoramento da integridade esportiva.
Na prática, isso significa que empresas como a IBIA se tornam peças obrigatórias no ecossistema regulatório. Não apenas fornecedoras de dados, mas intermediárias privilegiadas entre casas de apostas e o Estado.
A lógica parece sólida: quanto mais volume de dados concentrado, mais fácil detectar fraudes.
Mas há um risco embutido nisso: centralizar a vigilância nas mãos de entidades privadas cria zonas cinzentas de poder — e pouca transparência pública.
Quem audita os auditores?
A IBIA é, de fato, uma das maiores entidades globais dedicadas ao monitoramento de integridade no setor privado.
Fundada em 2005, com sede internacional, a associação atua sem fins lucrativos e hoje inclui mais de 140 operadoras, espalhadas por seis continentes.
Entre suas funções estão:
Análise transacional em tempo real de apostas por usuário;
Identificação de padrões suspeitos associados a eventos esportivos;
Emissão de alertas internos e relatórios às autoridades e federações.
A associação mantém parcerias com entidades como FIFA, UEFA, COI, ITIA, e diversos reguladores nacionais. Em seu último relatório trimestral, reportou 63 alertas globais apenas no 1º trimestre de 2025.
A IBIA tem um papel relevante no cenário internacional. Mas é preciso perguntar: quais os critérios de atuação da entidade? Há padronização nos relatórios?
Quem fiscaliza os alertas? Há prestação pública de contas para os jogadores, clubes ou operadores pequenos?
A lógica da autorregulação funciona — até certo ponto. Mas quando o Estado terceiriza a vigilância da integridade para uma associação formada por operadores privados, há o risco de autoproteção institucional.
Ou seja: alertas só aparecem onde há interesse, e falhas são interpretadas sob conveniências comerciais.
Dados compartilhados com o governo: até onde vai a transparência?
O acordo prevê o compartilhamento de informações com o Ministério do Esporte. Mas que tipo de dado será compartilhado?
Além disso, o acordo não esclarece se os dados repassados virão diretamente das operadoras associadas, da própria IBIA ou de intermediários regulatórios.
A ausência de um protocolo público de envio e recebimento dessas informações fragiliza o caráter de fiscalização e dificulta o controle social.
Para além da retórica da “cooperação”, o que se espera é um sistema estruturado, com trilha de auditoria, logs de envio, notificações formais e órgãos responsáveis claramente nomeados em caso de incidentes. Sem isso, não há garantia de que o pacto funcione na prática — ou que seja auditável pelo poder público.
Dados em tempo real sobre padrões anormais?
Informações sobre apostas de atletas e árbitros?
Movimentações suspeitas por CPF?
Relatórios agregados e estatísticos?
E mais: quem tem acesso a esses dados dentro do governo? Eles serão cruzados com dados da Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA)? Estarão sujeitos à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD)?
São perguntas que precisam ser feitas — e respondidas — antes de celebrarmos qualquer “marco”.
Cooperação ou blindagem institucional?
A retórica usada pelo Ministério do Esporte e pela IBIA reforça a ideia de um pacto pela “lisura” e “transparência”, mas evita o ponto central: a integridade esportiva não pode ser usada como escudo retórico para blindar empresas que, na prática, podem estar envolvidas em práticas questionáveis.
A questão não é se a IBIA tem know-how. Ela tem. A questão é se a cooperação com o governo será usada para proteger o consumidor ou para manter a estrutura atual sem questionamento público.
A recente CPI das Apostas mostrou que muitas casas operam com pouca ou nenhuma transparência sobre termos de uso, saldo fictício, publicidade disfarçada e limites arbitrários.
Integridade não é só evitar fraude de resultado. É garantir regras claras, simetria de informação e direito do jogador.

O papel do Ministério do Esporte: proativo ou decorativo?
Ao celebrar o acordo, o ministro André Fufuca disse que “atletas, clubes, entidades, torcedores e toda a população poderão ter plena confiança na lisura dos resultados”.
A fala soa bem — mas é preciso lembrar que o Ministério do Esporte não é o órgão regulador das apostas no Brasil.Essa responsabilidade está com o Ministério da Fazenda, por meio da Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA).
Isso levanta dúvidas sobre a efetividade do acordo:
O Ministério do Esporte poderá acionar operadoras ou apenas notificar a SPA?
Há interface entre os dois ministérios para tratamento de incidentes?
O acordo muda algo na prática para clubes, atletas e federações?
Sem clareza, o que se tem é mais um instrumento simbólico — com pouca eficácia operacional.
Vale lembrar que o mercado brasileiro de apostas está em fase de transição: parte do setor opera sob o novo regime regulatório, com licenças em processo, e outra parte ainda opera informalmente — com CNPJs de fachada, sites espelhados e pouca transparência.
Dessa forma, é essencial que acordos como este não sirvam apenas aos players já estabelecidos ou aos operadores que, por fazerem parte da IBIA, gozam de blindagem tácita.
Integridade, para ser real, precisa alcançar o setor como um todo — não só a elite regulada.
Transparência exige mais do que parceria
O que falta, neste momento, é:
Um repositório público de alertas de integridade, para que a sociedade acompanhe os casos detectados;
Regras claras sobre como casas de apostas devem reagir aos alertas;
Um cronograma de implementação da vigilância em todas as modalidades esportivas;
A presença da ANPD e do Ministério da Justiça nas tratativas, especialmente quando houver cruzamento de dados pessoais.
Cooperação com entidades privadas é válida. Mas transparência não pode ser opcional.
Considerações finais
O acordo entre a IBIA e o Ministério do Esporte marca um passo importante na construção de um mercado mais ético e seguro. Mas celebrar integridade sem discutir governança é insuficiente.
Monitoramento sem prestação de contas é só vigilância seletiva. Cooperação sem critério público é risco institucional.
Se o Brasil quer um mercado de apostas confiável, precisa:
De acordos, sim.
Mas também de auditoria.
De transparência.
De fiscalização de quem vigia.
E de mecanismos de escuta do consumidor — o verdadeiro elo frágil dessa cadeia.
Porque não há integridade sem transparência. E não há transparência sem controle público.
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