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Terreno pronto para a CaixaBet?

  • Foto do escritor: Fred Azevedo
    Fred Azevedo
  • 7 de jun.
  • 7 min de leitura

Atualizado: 25 de jun.

Brasil empurra o mercado legalizado para o limite: entre tributação excessiva, cartelização regulatória e censura publicitária, o cenário afunila o setor até restarem poucos — e previsíveis — vencedores.


Logotipo fictício da marca "CaixaBet", inspirado na identidade visual das Loterias Caixa, com as palavras "Caixa" e "Bet" em azul e laranja.
Terreno pronto para a CaixaBet?
“Um mercado onde só sobrevivem os gigantes — ou quem tem o apito na mão — não é livre. É concentrado. E perigosamente próximo de um cartel institucionalizado.”

A regulamentação das apostas no Brasil nasceu com discurso de modernização, mas a prática revela um projeto diferente: mais excludente, assimétrico e funcional apenas para grandes operadores — entre eles, possivelmente, o próprio Estado. O que se desenha não é um monopólio declarado, mas sim uma cartelização velada, conduzida por critérios regulatórios e fiscais que eliminam gradualmente os pequenos e travam os médios.


O Ministério da Fazenda voltou a colocar em pauta o aumento da alíquota sobre o GGR (Gross Gaming Revenue), passando de 12% para 18%, conforme revelou a reportagem da SBC Notícias. A proposta reacende o debate sobre os limites da tributação em um setor que mal começou a se estruturar sob a nova legislação.


Com a nova alíquota somada ao PIS/Cofins, ISS e possível inclusão no Imposto Seletivo, a carga pode chegar a 56,25% em algumas praças. Isso compromete a viabilidade operacional das casas legalizadas e fere o princípio da não confiscatoriedade tributária garantido pela Constituição. Como alerta o artigo publicado pelo BNLData, a tributação não pode anular a atividade econômica: isso é confisco — e confisco é inconstitucional.


Nesse ambiente, não é preciso proibir explicitamente ninguém. Basta empurrar as condições de operação para um ponto onde só sobrevivem os grandes grupos internacionais e operadores institucionais com vantagens de origem, como a Caixa Econômica Federal. E o que deveria ser regulação se transforma, silenciosamente, em curadoria estatal de mercado.


Um ecossistema cada vez mais estreito: tributário por fora, concentrado por dentro


O aumento de impostos não é um movimento isolado. Ele compõe um cenário mais amplo e coerente: o estreitamento progressivo das condições de permanência no mercado regulado. A cada portaria publicada, a cada exigência técnica adicionada, a cada trava sobre publicidade ou bônus, o setor legalizado vai se tornando menos acessível — não por mérito, mas por custo.


Hoje, operar legalmente no Brasil requer mais do que cumprir a lei. Requer estrutura corporativa de alta complexidade, capacidade de lidar com auditorias permanentes, capital para antecipar obrigações de outorga e fôlego para suportar fluxos tributários que comprometem qualquer plano comercial de médio prazo.


Essa pressão não seleciona os melhores. Seleciona os maiores.


Enquanto isso, o mercado informal segue operando sem qualquer desses entraves — sem certificado, sem sistema antifraude, sem deveres de Jogo Responsável. A concorrência, portanto, não é entre iguais. É entre quem joga com colete de chumbo e quem corre livre na pista.


E no meio dessa deformação, forma-se uma elite regulada. Um grupo seleto de operadores globais — com presença prévia em dezenas de mercados, times jurídicos consolidados e margens que absorvem o peso fiscal. Ao lado deles, um player com características únicas: a Caixa Econômica Federal, que se aproxima do setor com a tranquilidade de quem já domina os canais de distribuição, tem acesso privilegiado ao sistema bancário e dispensa esforços de marketing para ser reconhecida.


Não é que o Brasil esteja criando um monopólio. Está criando um oligopólio autorizado, funcional ao governo e disfarçado de concorrência.


Com monopólio nas loterias e escala nacional, a CaixaBet não precisa competir — só esperar.


Em qualquer mercado, tamanho importa. E no setor brasileiro de jogos e loterias, ninguém é maior que a Caixa.


Detentora do monopólio das atividades lotéricas no país, com presença física em praticamente todos os municípios e integração direta com o sistema bancário nacional, a Caixa Econômica Federal e a futura CaixaBet não precisarão de vantagens adicionais para se destacar. A Caixa já opera em escala — e sob regras — que a colocam em uma categoria própria.


Para entender a dimensão disso, basta o comparativo feito por Roger Amarante, especialista do setor, entre dois modelos que coexistem hoje no país: a Bet365, um dos maiores operadores privados do mundo, e as Loterias da Caixa, estatal brasileira.


Em 2024, os volumes foram surpreendentemente próximos: R$ 24 bilhões movimentados pela Bet365 globalmente, contra R$ 25,9 bilhões arrecadados pela Caixa apenas com suas loterias.


Mas a semelhança termina aí.


Enquanto a Bet365 devolveu entre 80% e 90% do valor arrecadado em prêmios e ainda gerou lucro líquido de R$ 3,2 bilhões, com R$ 800 milhões pagos em impostos no Reino Unido, a Caixa distribuiu apenas 34% em prêmios e lucrou R$ 70 milhões no ano. O payout das loterias da Caixa está bem abaixo da média internacional, que gira em torno de 60% em mercados como Europa e EUA.


Ou seja: o Brasil já é um dos maiores mercados globais em volume bruto, mas opera com baixa eficiência e pouco retorno ao jogador. A regulamentação das apostas online surgiu como oportunidade histórica para inverter esse modelo: criar um mercado mais justo, mais transparente e mais competitivo — onde o mérito supere o monopólio e a informalidade.


Mas se o ambiente legalizado continuar afunilando até restarem apenas os grandes — e os estatais —, o resultado será a formação de um cartel regulado pelo próprio sistema. E nesse cenário, a Caixa não precisa correr. Basta continuar onde sempre esteve.


Fuga para o cinza: a canalização falha empurra empresas para a margem


A canalização — conceito central da regulação moderna — pressupõe-se que regras claras, viabilidade econômica e fiscalização justa atrairiam operadores para dentro da legalidade. Mas no Brasil, esse processo começou invertido: alto custo, retorno incerto, exigências técnicas pesadas e pouca previsibilidade regulatória.

O resultado? Em vez de atrair, o sistema repele.


Empresas médias e pequenas, que não conseguem competir com as estruturas dos gigantes nem com a liquidez de estatais, recorrem a saídas paralelas para continuar existindo. Algumas migram para domínios estrangeiros. Outras operam sob marcas alternativas, terceirizam sua captação para afiliados não nomeados ou mantêm campanhas sob perfis não oficiais. Tudo sem romper totalmente com a legalidade — mas o bastante para flutuar num limbo jurídico.


É o chamado mercado cinza: onde há operação, mas não necessariamente autorização.


Para outras operadoras, o cenário é ainda mais direto: saída do país, encerramento de CNPJ e recuo definitivo da tentativa de se manter regular.


O que era para ser uma transição inteligente e estruturada, baseada em incentivo e estabilidade, virou um funil com base estreita e teto baixo. Poucos entram. Muitos desistem. E o espaço que sobra é, ironicamente, reocupado por sites não licenciados — que continuam operando livremente, captando com agressividade e sem qualquer contrapartida em tributos ou responsabilidade.


No fim, quem perde é o jogador. Fica sem proteção, sem canal de recurso, sem garantias sobre o uso de seus dados ou pagamento de seus prêmios.

E quem ganha? O mercado que opera fora das regras. Ou o cartel que aprende a usá-las como barreira de entrada.


Publicidade sob cerco: quando comunicar vira privilégio — e não direito regulado


Se o ambiente tributário já comprime margens e a complexidade regulatória elimina concorrentes menores, as restrições à publicidade completam o cerco institucional. O Projeto de Lei 2.985/2023, aprovado com celeridade no Senado, ainda precisa passar pela Câmara, mas já impõe um sinal claro: o setor legalizado está na mira — e as restrições à comunicação podem se tornar mais severas para quem segue as regras.


A proposta limita anúncios durante transmissões ao vivo, veta o uso de influenciadores e restringe horários e formatos de veiculação — inclusive em canais próprios das operadoras. As exceções são técnicas, restritas e sujeitas a autenticação prévia do usuário.


A intenção declarada é proteger o consumidor. Mas, como mostra o artigo Associações pedem freio na tramitação do PL das apostas, publicado pelo próprio Portal Fred Azevedo, a crítica das entidades do setor é clara: o texto, da forma como está, fragiliza ainda mais as operadoras licenciadas, enquanto ignora por completo o funcionamento agressivo — e desregulado — do mercado pirata.


Sem mecanismos eficazes de fiscalização digital, como bloqueio de domínios, penalização a intermediários e controle de afiliados, o projeto acaba restringindo apenas quem já está dentro da lei. E pior: desloca o marketing para canais opacos, sem qualquer supervisão ou compromisso com o Jogo Responsável.


Nesse cenário, a comunicação deixa de ser um direito regulado e se transforma em privilégio para poucos — ou em ferramenta irrestrita nas mãos de quem atua à margem.


Não é desordem. É engenharia: um mercado feito para poucos


A regulamentação das apostas poderia ter sido uma virada institucional: mais arrecadação, mais transparência, mais retorno para quem aposta — e mais segurança jurídica para quem opera. Mas o que se desenha hoje é o oposto desse ideal.


O ambiente legalizado no Brasil está sendo moldado não para acolher e ordenar a pluralidade de operadores, mas para selecionar — por resistência, por capital, por origem. A cada camada adicional de exigência técnica, restrição publicitária ou ônus tributário, o setor se estreita. O discurso de canalização não se sustenta quando o resultado concreto é a concentração do mercado em torno de poucos grupos, enquanto o restante migra para o cinza ou abandona de vez o país.


Essa não é uma consequência aleatória. É o efeito de uma arquitetura de sistema que premia quem já é gigante, penaliza quem tenta crescer e ignora completamente quem nunca quis jogar limpo.


No meio disso, o consumidor é empurrado para fora do ambiente protegido. E a promessa de um mercado competitivo e transparente vai se transformando em mais um setor com acesso restrito, retorno limitado e risco social crescente.


Não basta dizer que há regulação. É preciso olhar para quem ela serve — e quem ela deixa para trás.


Nota editorial


Este artigo tem caráter jornalístico e analítico. Seu conteúdo busca refletir sobre os efeitos práticos do atual modelo de regulamentação das apostas no Brasil, com base em dados públicos, projeções setoriais e comparações técnicas amplamente divulgadas.

Não se fazem aqui acusações diretas a pessoas físicas ou jurídicas, tampouco se questiona a legalidade de operações autorizadas por lei. As menções à Caixa Econômica Federal têm propósito exclusivamente editorial, ilustrando uma tendência de concentração de mercado observada por especialistas do setor.


Nosso compromisso permanece com a apuração responsável, a defesa do consumidor e o estímulo a um mercado regulado que seja competitivo, eficiente e justo — para o país, para os operadores e, principalmente, para quem joga dentro das regras.

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© 2025 por Frederico de Azevedo Aranha

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