O apostador comum existe: o que os dados da Pay4Fun revelam sobre a base real do setor
- Fred Azevedo
- há 3 dias
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Atualizado: há 2 dias
Mais de 94% dos depósitos são inferiores a R$ 100. Quase 97% das transações são feitas via Pix. Em vez de histeria fiscal, os números pedem regulação equilibrada, proteção inteligente — e menos preconceito.

Enquanto Brasília discute aumentos de impostos, cria tributos experimentais como a CIDE-Bets, e parte da imprensa trata o apostador comum médio como um predador em potencial, os dados mostram uma realidade muito mais simples — e mais humana: a esmagadora maioria dos brasileiros que aposta, aposta pouco. E faz isso via Pix.
“Esse comportamento é padrão em mercados recém-regulados. O consumidor começa pequeno até se familiarizar com a legislação e os mecanismos operacionais.”— Leonardo Baptista, CEO da Pay4Fun
Segundo levantamento da Pay4Fun, fintech de pagamentos integrada a dezenas de casas de apostas licenciadas, 94,3% dos depósitos realizados entre janeiro e fevereiro de 2025 foram inferiores a R$ 100.
Apenas 1,4% ultrapassaram R$ 1.000, e menos de 0,3% foram acima de R$ 2.500.
Além disso, em 2024, 96,72% das transações para plataformas de apostas foram feitas via Pix, segundo outro relatório da empresa, divulgado pelo portal Poder360.
Os dados são reveladores. Eles desconstroem a retórica alarmista e ajudam a entender como de fato se comporta a base do mercado regulado.
E, talvez mais importante: apontam para os erros de premissas que sustentam tanto propostas tributárias abusivas quanto narrativas políticas que criminalizam a atividade como um todo.
O perfil que ninguém quer admitir: o apostador comum brasileiro é pequeno, digital e cauteloso
Os dados da Pay4Fun, anonimizados e organizados com base nas plataformas integradas à empresa, traçam um perfil comportamental consistente: a maioria absoluta dos usuários realiza apostas de baixo valor, em média inferiores a R$ 50, e tende a operar em plataformas licenciadas com pagamentos 100% digitais.
Esse padrão não é exclusivo do Brasil. Mercados recém-regulados costumam apresentar comportamento conservador por parte dos consumidores, que testam a estabilidade do ambiente, se familiarizam com os operadores e só depois desenvolvem rotinas mais frequentes.
Em países como Espanha, Portugal e Colômbia — que passaram por processos semelhantes nos últimos dez anos — o padrão se repetiu: predominância de pagamentos instantâneos, alta penetração bancarizada, uso crescente de ferramentas de autocontrole e valor médio por transação em patamares baixos.
No Brasil, o Pix potencializou esse comportamento. Com liquidez instantânea, ausência de tarifas e facilidade de integração às operadoras, o Pix virou o principal meio de pagamento do setor.
E, por consequência, também virou o principal alvo das campanhas de bloqueio à pirataria e evasão fiscal.
A quem interessa ignorar esse perfil?
Esse perfil de apostador não aparece nos discursos mais comuns do Congresso, nem nas entrevistas dos parlamentares que defendem a criação de novos tributos “para proteger a sociedade”.
Ao invés disso, vendem-se três estereótipos:
O viciado crônico, que aposta valores altos, esconde a prática da família e compromete o orçamento doméstico.
O influenciável impulsivo, manipulado por influenciadores digitais e aplicativos coloridos.
O oportunista que busca renda extra nas apostas, como se fosse investimento.
Nenhum desses perfis representa o padrão médio revelado pelos dados. E isso importa — porque política pública se faz com base, não com exceção.
Quando uma medida como a CIDE-Bets propõe tributar o depósito — e não o lucro — em 15%, é esse jogador de R$ 50 que será afetado.
Não o grande apostador.
Não o pirata. Não o operador offshore.
Mas o trabalhador comum, que aposta baixo, paga via Pix e está na legalidade.
Pix: o grande protagonista ignorado pela regulação
O levantamento da Pay4Fun também expõe algo que a regulação ainda não soube tratar com a devida centralidade: o Pix é o sistema nervoso do ecossistema regulado.
Ele viabiliza a formalização da experiência, permite rastreabilidade, reduz fraudes e facilita a devolução em caso de falhas.
Com quase 97% das transações realizadas via Pix, qualquer política pública que deseje fortalecer o setor — ou combatê-lo com inteligência — deve começar pelo mapeamento, filtragem e monitoramento desses fluxos.
Hoje, a ausência de uma integração sistêmica entre Banco Central, SPA e operadoras dificulta o combate ao mercado ilegal, que se beneficia da mesma infraestrutura para operar sem licença, mascarando CNPJs e saltando de gateway em gateway.
O Pix é a arma mais poderosa contra a pirataria — e, paradoxalmente, também é o que mais sofre quando as medidas são pensadas com viés arrecadatório ou punitivo mal calibrado.
Desinformação e oportunidade: o uso político da exceção como regra
A cada nova manchete sobre um caso extremo — alguém que perdeu tudo, um influenciador que ostentou ganhos, uma live com saldo fake — o ciclo se retroalimenta. A exceção vira regra. O número vira justificativa. O tributo vira discurso.
Mas os dados não mentem: a maioria dos apostadores não movimenta altos valores, não joga de forma compulsiva e não vive disso. A base da pirâmide quer segurança, previsibilidade, saque rápido e respeito.
É exatamente esse perfil que será o mais punido se o Pix for travado, se os tributos incidirem antes da aposta e se a narrativa do “vício estatal” justificar mais restrições do que soluções.
O que os dados revelam — e o que o Estado ainda se recusa a ver
O estudo da Pay4Fun cumpre um papel raro no debate público: ele apresenta fatos.
Mostra que:
A maioria aposta pouco.
A maioria usa Pix.
A maioria está no ambiente regulado.
Em vez de fortalecer essa base, parte do Estado prefere sufocá-la — com tributos que não distinguem volume, políticas que não consideram comportamento e decisões que não conversam com a realidade técnica.
Mais do que desinformação, é desinteresse institucional.
Conclusão: a regulação precisa olhar para o comportamento, não para o alarde
O mercado de apostas legal no Brasil está em sua fase mais sensível. A consolidação depende de confiança — e confiança se constrói com transparência, não com punição.
Os dados da Pay4Fun mostram que há uma base sólida, digitalizada, bancarizada e legal. Um mercado que se parece muito mais com o usuário médio da economia digital do que com os estigmas construídos sobre ele.
Se a regulação quiser sobreviver, precisa proteger esse usuário. E, para isso, precisa conhecê-lo.
Nota editorial
O Portal Fred Azevedo defende o direito do jogador comum a um mercado seguro, fiscalizado e justo. A cada novo dado revelado sobre o comportamento dos usuários, reforça-se o que temos repetido desde o início: o problema não é o sistema em si — é a distorção das prioridades institucionais. Continuaremos aqui para garantir que a base, silenciosa e responsável, não seja sacrificada pelo ruído dos extremos.